PRANTO NOS ANDES
Na memória do povo chileno, ainda pairava cenas de horror daquele fatídico ano; recordavam-se perdas de casas, bens em geral, e, mais que tudo, a vida de seus entes queridos. Eu, estrangeiro, não conseguia dimensionar a intensidade do pavor que dominava os nacionais do país de Cecilia Boloco, de Isabel Allende, de Gabriela Mistral, de Pablo Neruda.
O impacto foi forte! Sólido, o prédio parecia ter sido abalroado por uma locomotiva. Em Santiago, da escrivania levantei e me dirigi à porta, para entender o que sucedia. No corredor, reinava silêncio absoluto nos olhares de exclamação e, ao mesmo tempo, interrogativos, como se todos atendessem uma repentina convocação mandatória. Foi quando me dei conta de que, aquele dia, o tremor de um só golpe se classificava em grau mais elevado da escala "Richter". Eram dias de ebolições políticas, com ruidosas mobilizações das massas, com gritos de cidadania, agitações estudantis e duelos partidários ferrenhos; transições de poder; tempos, também, de mudanças sociais, econômicas e culturais. Momentos haviam em que se criam que as diferenças ideológicas, manifestas ou latentes, nunca se atenuariam e que o antagonismo acirrado culminaria em batalhas a cada quarterão da Capital. Mas algo dicipava a animosidade dos adversários e fazia convergir o povo aos sentimentos de compaixão e de solidariedade: o temor à reincidência de sismos de grande magnitude, como o terremoto ocorrido em março de 1985. Precisamente vinte e cinco anos após, voltado para o oceano pacífico e de extensão que alcança ilhas polinésias e que abriga belezas multifacéticas, aquele país sul-americano volta a chorar seus mortos e a contar seus desabrigados; uma vez mais, homens e mulheres recorrerem à violência, hoje, para aplacar a fome e atender as necessidades básicas, próprias e as de seus familiares, enquanto a ajuda nacional e internacional não chega. A surpreendente força telúrica, que causou o deslocamento do eixo da Terra, reduzindo a duração do dia em nosso planeta e seguida dos efeitos do tsunami que arrasou trechos da costa chilena, criou imagens dantescas, redesenhando um país diferente do que conheci com os encantos de Vale Nevado, das Termas de Chillián, do Deserto de Atacama e demais marcos naturais. Neste ensejo, ao agradecer reiteradamente ser o Brasil poupado de sinistros iguais a esse ou de semelhantes catástrofes, elevo meu pensamento aos céus com súplicas, no sentido de que, misericordiamente, Deus vele por aquela nação andina, confortando, abrigando e nutrindo nossos irmãos de "Rapa Nui" (Ilha de Páscoa), do arquipélago de Juan Fernández, da cidade de Concepción ... E que permita a volta dos pares à dança da "cueca", do povo a saborear a "empanada" e de todas as Regiões ao festejo, em Viña del Mar, aos cânticos de alegria. Desejo que em breve as vozes nativas e patrióticas, com seu orgulho característico, reúnam forças para exclamar, uníssonas e com altivez: - "Chi, chi, chi; le, le, le; Viva Chile!"
Israel dos Santos
Enviado por Israel dos Santos em 03/03/2010
Alterado em 06/12/2010 Copyright © 2010. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |